domingo, 22 de julho de 2012

Modéstia dos Olhos

("Escola da Perfeição Cristã", obra compilada dos escritos de Santo Afonso Maria de Ligório, Doutor da Igreja, vertida para o português segundo a edição alemã do Padre Paulo Leick, pelo Padre José Lopes, C.SS.R)


Quase todas as paixões que se revoltam contra nosso espírito têm sua origem na liberdade desenfreada dos olhos, pois os olhares livres são os que despertam em nós, de ordinário, as inclinações desregradas. "Fiz um contrato com meus olhos de não cogitar sequer em uma virgem", diz Jó (Job 31, 1). Mas, por que diz ele de não pensar sequer em uma virgem?

Não parece que deveria dizer: Fiz um contrato com meus olhos de não olhar sequer? Não, ele tem toda a razão de falar assim, porque o pensamento está intimamente ligado ao olhar, não se podendo separar um do outro e, para não ter maus pensamentos, propôs-se esse santo homem nunca olhar para uma virgem.

Santo Agostinho diz: "Do olhar nasce o pensamento, e do pensamento nasce a concuspiscência". Se Eva não tivesse olhado para o fruto proibido, não teria pecado; ela, porém, achou gosto em contemplá-lo, parecendo-lhe bom e belo; apanhou-o então, e fez-se culpada da desobediência.

Aqui vemos como o demônio nos tenta primeiramente a olhar, depois a desejar e, finalmente, a consentir.

Por isso nos assegura São Jerônimo que o demônio só necessita de nosso começo: dá-se por satisfeito se lhe abrimos a metade da porta, pois ele saberá conquistar a outra metade. Um olhar voluntário, lançado a uma pessoa de outro sexo, acende uma faísca infernal que precipita a alma na perdição. "As primeiras setas que ferem a alma castas, diz São Bernardo (De mod. ben. viv., serm. 23) e não raro as matam, entram pelos olhos". Por causa dos olhos caiu Davi, esse homem segundo o coração de Deus.

Por cauda dos olhos caiu Salomão, esse instrumento do Espírito Santo. Por causa dos olhos, quantas almas não se perderam eternamente?

Vigie, pois, cada um sobre seus olhos, se não quiser chorar uma vez com Jeremias: Meus olhos me roubaram a vida" (Jer 3, 51); as afeições criminosas que penetraram em meu coração por causa dos meus olhares, lhe deram a morte. São Gregório  diz (Mor. 1, 21, c. 2): "Se não reprimires os olhos, tornar-se-ão ganchos do inferno, que à força nos arrastarão e obrigar-nos-ão, por assim dizer, a pecar contra a nossa vontade". "Quem contempla objeto perigoso, acrescenta o Santo, começa a querer o que antes não queria" É também o que diz a Sagrada Escritura (Jdt 16, 11), quando diz que a bela Judite escravizou a alma de Holofernes, apenas este a contemplou.

Sêneca diz que a cegueira é mui útil para a conservação da inocência. Seguido esta máxima, um filósofo pagão arrancou-se os olhos para guardar a castidade, como nos refere Tertuliano. Issp, porém, não é lícito a nós, cristãos; se queremos conservar a castidade, devemos, contudo, fazer-nos cegos por virtude, abstendo-nos de olhar o que possa despertar em nós os maus pensamentos. "Não contemples a beleza alheia; disso origina-se a concuspiscência, que queima como o fogo" (Eclo 9,8)

São Francisco Sales dizia: "Quem não quiser que o inimigo penetre na fortaleza, deve conservar as portas fechadas". Por essa razão foram Santos tão cautelosos em seus olhares. pr temos de encergarem inesperadamente qualquer objeto perigoso, conservavam os olhos quase sempre baixos e se abstinham de olhar coisas inteiramente inocentes. São Bernardo, depois de um ano inteiro no noviciado, não sabia ainda se o teto de sua cela era plano ou abobadado.
Na Igreja do convento havia três janelas e ele não o sabia, porque conservara os olhos baixos. Evitavam os Santos, com cautela maior ainda, põr os olhos em pessoa de outro sexo. São hugo, bispo, nunca olhava para o rosto das mulheres com quem tinha de conversar. Santa Clara nunca olhava para a face de um homem. Aconteceu uma vez que, levantando os olhos para a Hóstia Sagrada, durante a Elevação, viu o rosto do sacerdote, com o que ficou profundamente aflita.

Julgue-se agora quão grande é a imprudência e temeridade dos que, não possuindo a virtude dum desses Santos, ousam passeas suas vistas em todas as pessoas, não excetuando as de outro sexo, e querendo ainda ficar livre de tentações e do perigo de pecar.

São Gregório diz que as tentações que levaram São Bento a revolver-se sobre espinhos, provieram de um olhar imprudente sobre uma senhora. São Jerônimo, achando-se na gruta de Belém, onde continuamente orava e macerava seu corpo ocm as mais atrozes penitências, foi por longo tempo atormentado pela lembrança das damas que vira tempos antes em Roma. Como, pois, poderemos ficar preservados de tentações. qiando nos expomos ao perigo, olhando e até fitando complacentemente pessoas de outro sexo?

(...)

Deve-se notar também que a modéstia dos olhos é necessária não só para nosso próprio bem, como para a edificação do próximo. Só Deus vê  o nosso coração; os homens vêem apesas nossas obras externas e, ou se edificam, ou se escandalizam com elas. "Pelo rosto se conhece o homem", dizia Escritura (Eclo 19,26), isto é, pelo seu exterior se depreende o que é o homem interiormente. Todo cristão, por isso deve ser o que era São João Batista, conforme as palavras do Salvador (Jo 5, 35): "Uma lãmpada que arde e ilumina". Interiormente deve arder em amor divino; exteriormente, alumiar, pela modéstia, a todos os que o v~eem. Também a nós se podem aplicar as palavras que São Paulo dirigiu a seus discípulos (ICor 4,9): "Somos o espetáculo dos anjos e dos homens". "A vossa modéstia seja conhecida de todos os homens" (Filip. 4,5)

Pessoas devotas são observadas pelos anjos e pelos homens, e, por isso, sua modéstia deve ser notória a todos, do contrário, deverão dar rigorosas contas a Deus no dia do Juízo. Observando a modéstia, edificamos sumamente os outros e os estimulamos à prática da virtude.

Santo Ambrósio diz que a modéstia das pessoas virtuosas é uma exortação mui poderosa ao coração dos mundanos. "Quão belo não seria se bastasse te apresentares em público para fazeres bem aos outros!".

(...)

São Basílio a seus monges: "Se quisermos que nossa alma tenha suas vistas sempre postas no Céu, filhos queridos, conservemos nossos olhos sempre voltados para a terra". De manhã ao despertar, devemos já pedir, com o Profeta: "Afastai meus olhos, senhor, para que não vejam a vaidade." (Salmo 118, 37)

SALVE MARIA PURÍSSIMA

RAINHA DO ROSÁRIO, ROGAI POR NÓS!

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